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A inflação é o gatilho da crise de hoje?

Atualizado: 13 de abr. de 2021



Imagine, por exemplo, chegar no mercado, ver um produto a um preço x, depois voltar no dia seguinte, e ele custar duas vezes mais. Assim como, ao pegar algo na prateleira, notar que existem etiquetas de remarcação de preços, umas sobre as outras. Tais situações eram extremamente corriqueiras entre as décadas de 80 e 90 (logo após o “Milagre Econômico” brasileiro ocorrido durante a Ditadura Militar) evidenciando, assim, as oscilações diárias na precificação. Esse caos e instabilidade na economia nacional é a inflação, elevada ao extremo.


Devido a más experiências como essa, as pessoas que vivenciaram esse período têm a tendência de correlacionar a crise atual, iniciada em 2015, com a inflação ao debaterem as motivações da recessão mais recente. Então, tendo em vista a relevância desse tema, iremos desmistificar esse dragão, que já tirou o sono dos brasileiros, e analisar de fato as motivações da recessão econômica do país no século XXI.


O que é?

A inflação, um dos mais importantes conceitos da macroeconomia de um país, pode ser resumida como o aumento médio generalizado dos preços de bens, produtos e serviços em uma região em um dado período de tempo. Todavia, essa definição, apesar de ser a mais comum, não é unânime. A Escola Austríaca de economia, por exemplo, a define como um aumento na quantidade de dinheiro e de crédito em circulação ocasionada pela criação adicional de dinheiro (expansão monetária). E a elevação generalizada dos preços (definição apresentada anteriormente) como uma consequência disso.


Apesar dessas controvérsias quanto à definição, ela é indicada, principalmente, a partir do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), calculado pelo IBGE. Todavia, existem outros índices, tais como o IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado), elaborado pela FGV e o IPC (Índice de Preços ao Consumidor), pelo FIPE.


Ademais, é unânime que quando tal índice está elevado, o poder de compra da população é reduzido. Isso se dá, pois o poder de compra está atrelado a quantidade monetária que você tem disponível para adquirir uma determinada quantidade de bens e serviços. Por exemplo, João possui 6 reais e foi ao mercado buscando comprar 2kg de tomate (usualmente a R$3,00 cada), mas por períodos de entressafra, o preço estava próximo a R$6,00 cada, possibilitando-o comprar apenas 1kg, o que reduziu, então, o seu poder de compra.


Além disso, essa alta generalizada e contínua dos preços costuma provocar recessão e desvalorização acentuada da moeda, como foi o caso do Cruzeiro, moeda brasileira instituída durante o governo Collor (1990 - 1992). Neste período, eram necessários 10.264,67 Cruzeiros para comprar 1 Dólar e a inflação alcançou 764% ao ano.


Causas:

A inflação pode surgir quando a demanda pelos produtos é maior do que a sua oferta, já que, no livre mercado, isso representa um aumento no preço de venda dos produtos. Junto disso, ela pode ocorrer devido a uma grande circulação de moeda no mercado, pois, por irresponsabilidade fiscal, o governo gasta mais do que arrecada, sendo, com isso, induzido a imprimir mais dinheiro do que possui em bens e a gerar mais títulos de capitais, ou então, a partir das taxas de juros, como será explicado mais adiante. Isso causa, então, um desequilíbrio econômico, pois, com mais dinheiro em circulação, maior é o consumo (demanda), estimulando os preços a subirem, como foi explicado anteriormente.


Inflação x Deflação:

Apesar de os pontos negativos da inflação terem se destacado até aqui, não vá achando que a inflação é o maior inimigo das finanças de um país. A sua presença é crucial para sinalizar crescimento econômico, porque, em cenários de deflação (inflação negativa), os preços ficam menores, isto é, os produtos mais baratos.


Para entender porque isso é um problema, imagine, por exemplo, que você quer comprar um novo computador, mas fica sabendo que vai ter a 'Black Friday' no mês que vem. Por que você vai comprar agora se pode esperar para comprar mais barato? Logo, em períodos de deflação é como se houvesse uma ‘Black Friday’ contínua, e existisse essa postergação do consumo, pois os consumidores ficariam esperando o preço abaixar mais e mais, mesmo já estando barato. Então, a partir dessa lógica contrária, é possível perceber a importância de uma inflação positiva para qualquer tentativa de desenvolvimento econômico.


Nesse sentido, a deflação é indesejada, já que com essa procrastinação do consumo, a produtividade de um país desacelera. Com menor produtividade, não faz sentido a geração de novos empregos, pelo contrário, há o corte dos mesmos, que leva o nome de desemprego conjuntural. Além disso, como o preço dos produtos vendidos decresce consideravelmente, o lucro diminui muito, podendo até gerar prejuízos. Com isso, muitos empresários tendem a fechar os seus negócios, gerando ainda mais desemprego. Portanto, para muitos economistas a inflação entre 2% e 3%, ou até 5% é um bom indicador de que a economia está saudável.


Como é feito esse controle?

No Brasil, visando ao controle mais efetivo da inflação, a partir de junho de 1999, o presidente do Banco Central, o Ministro da Fazenda e de Planejamento (Conselho Monetário Nacional - CMN), passaram a definir metas anuais de inflação e as bandas com as quais visam cumprir.


Desta forma, o simples esforço do governo federal para evitar um cenário de inflação alta ou muito baixa dá mais segurança para famílias, empresas e investidores, uma vez que haveria um sinal de que há comprometimento com a estabilidade e os rumos da economia. Abaixo, é possível visualizar as metas e as bandas, isto é, as margens de erro, dos últimos anos.




Mas você pode estar se perguntando: como o governo faz para alcançar essa meta a curto prazo? Esse ajuste é, principalmente, feito a partir das taxas básicas de juros, isto é, da taxa SELIC. Caso a inflação esteja alta, o Banco Central pode elevar essa taxa, com isso, o custo de crédito (capacidade de se obter o crédito) será maior, o que tende a reduzir o consumo. Então a partir de uma redução do consumo evidencia uma redução da demanda pelos bens de consumo no geral. Dessa forma, poderá haver uma diminuição dos preços, dado que a oferta por esses produtos seja mantida. Assim, de modo simplista, a inflação é reduzida.





Comparando-se esse gráfico, que apresenta a taxa de Juros Selic e o IPCA, sendo ambos mensurados no mesmo período de tempo, é possível perceber que em momentos de alta do IPCA como em 1997 e 2003, o governo tomou a providência de aumentar a taxa Selic, resultando, em seguida, na diminuição do índice de inflação. Visto isso, é evidenciado o uso da Selic como ferramenta de controle da inflação pelo governo, e a seu elevação é uma consequência do aumento do IPCA.


A situação descrita anteriormente aplica-se a um cenário mais imediatista. Todavia, para o crescimento de um país, são necessárias medidas de longo prazo. Para tais, é necessário que exista um incentivo à expansão produtiva, o que pode ser, naturalmente, feito pelo mercado ou incentivado por investimentos governamentais, de acordo com a política vigente em tal país. Nesse caso de crescimento, mais produtos serão produzidos, aumentando, em cenários ideais, a competitividade entre eles. Nesse sentido, haveria a redução de preço dos mesmos, para obter-se um maior número de consumidores, o que novamente seria um remédio para a alta da inflação.





Logo, analisando-se o PIB brasileiro e o IPCA no mesmo período de tempo, é possível perceber que não existe entre os dois índices uma relação tão direta. Porém, em casos de inflação muito alta ou muito baixa há uma desaceleração do consumo e, consequentemente, redução do PIB. Tal caso é perceptível em 2015, quando a inflação foi de 10% e a variação do PIB negativa, representando uma recessão.


Fatores da crise brasileira iniciada em 2015:

Provavelmente, lendo até aqui você deve estar tentando correlacionar as taxas e os indicadores previamente citados com a atual crise econômica que afeta o bolso de todo brasileiro. Por isso, nós não poderíamos deixar de fazer essa análise juntos. Então, primeiramente, vale analisarmos as taxas Selic, IPCA e o PIB brasileiro.


Atualmente, a taxa Selic é de 6,5% ao ano, um valor dentro da considerada margem ideal por muitos economistas, como Amir Khair (do jornal Folha de São Paulo). Comparando-se tal valor com os aplicados ao redor do mundo, é vista certa coerência, já que países do mesmo porte brasileiro, isto é, o BRICS, fazem uso de taxas próximas (Rússia - 7,5%, Índia - 6,5%, África do Sul - 6,5%). Em contrapartida, países desenvolvidos fazem uso de taxas de cerca 2% ao ano, mas é pouco coerente compararmos retornos em países de desenvolvimento econômico social tão distintos, muito porque os juros estão atrelados ao risco de tal investimento que são maiores em países em desenvolvimento.


Por outro lado, a taxa IPCA está em 2,95%, estando dentro da margem considerada ideal por muitas escolas de economistas (2 a 5%), sendo inclusive um gatilho para uma maior redução da taxa Selic. Além disso, tal valor encontra-se próximo ao de países em situação política mais estável, como é visto no balanço publicado pelo Trading Economics. Assim , é perceptível que o problema não está em nenhum dos dois indicadores citados até então.


Analisando-se, portanto, o PIB brasileiro, ele teve um crescimento anual de 1% em 2017, após dois anos de retração, indicando, com isso, uma recuperação econômica. Segundo o IBGE, tal aumento só foi possível devido ao incremento do consumo médio pelas famílias, que é responsável por 63,4% do PIB nacional. Isso se deve ao estímulo pela baixa inflação e recuperação do emprego.


Por outro lado, os gastos do governo encolheram 0,6% em 2017, principalmente por causa da PEC do Teto dos Gastos. Essa foi a maneira encontrada para frear o investimento e gasto federais por 20 anos, limitando-o a níveis abaixo da inflação, por causa da corrupção e má gestão pública. Essa diminuição auxiliou no recuo de 1,8% nos investimentos na economia, além de outros fatores político-econômicos, como a política de juros norte-americana que prejudica os emergentes e a perda do grau de investimento do Brasil. Isso fez com que o crescimento do PIB fosse menor. Abaixo é possível visualizar, exatamente esse desequilíbrio nas contas públicas.




Mas, infelizmente, esse corte ainda não conseguiu cumprir o seu objetivo, pois a dívida pública do governo federal fechou o ano de 2017 em R$ 3,55 trilhões, segundo dados divulgados pela Secretaria do Tesouro Nacional, órgão do Ministério da Fazenda. O valor é 14% maior do que no final de 2016. Com isso, é possível perceber que essa política pública foi insuficiente, já que ela sozinha não é capaz de resolver o problema fiscal brasileiro, como foi demonstrado em um relatório feito, em 2017, pelo Banco Mundial.


Portanto, tendo em vista os dados apresentados, para retomar de fato o crescimento do investimento na economia brasileira, alavancando, então, o PIB e a economia nacional, existem algumas alternativas. Uma delas seria a partir de incentivo ao investidor externo, com o aumento das taxas de juros, pois isso seria enxergado por ele como uma oportunidade de maiores ganhos. Todavia, como já foi demonstrado, aumentaria o custo de crédito e reduziria o crescimento econômico.


A outra forma de atração de investimento seria a partir da criação de uma cenário econômico e político mais estável, buscando-se continuamente o controle da inflação e facilitando a entrada e a criação de novas empresas por meio de diminuição das regulações e impostos que existem no Brasil, como é feito na Zona Franca de Manaus, por exemplo, que cede às indústrias lá instaladas isenção nos impostos de importação e exportação e de IPI (imposto sobre produtos industrializados). A partir disso, teve, em 2012, um faturamento superior a 37 bilhões de dólares.


Por outro lado, uma outra alternativa seria o aumento do investimento da União na economia, em valores antes praticados (acima da inflação), reduzindo, em contrapartida, outros gastos públicos, como os auxílios recebidos pelos 3 poderes. Com isso, ao fomentar a economia e a maior circulação do capital, existiria maior arrecadação por parte do Estado, por meio dos impostos que incidem sobre serviços e consumo. Logo, podendo haver um superávit primário das contas públicas, em cenários hipotéticos de excelente implementação de tal medida. Porém, uma injeção de recursos na economia apesar de gerar maior circulação de capital, aumenta a demanda pelo consumo, o que aumentaria os preços e geraria uma maior inflação, como foi explicado anteriormente.


Então, é perceptível que as crises econômicas não são tão simples de serem resolvidas, já que todas as hipóteses apresentadas tinham atreladas a elas um contraponto. Além disso, toda especulação e projeção é baseada em hipóteses e as ciências econômicas não dependem de análises frias e independentes, já que existem fatores externos que podem modificar e inviabilizar qualquer estudo, como uma valorização do dólar, crise em países vizinhos que pode refletir no Brasil, guerras, instabilidade política, etc. Então, nos resta aguardar os planos econômicos e as medidas implementadas pelos novos governantes que assumirão em janeiro de 2019 e o status da economia global nesse período.


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