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Green Bonds: o futuro com os ativos sustentáveis


Fonte: Instituto Propague, 2022


Os Green Bonds, em português, "títulos verdes" são instrumentos financeiros altamente buscados por bancos e investidores que estão à procura de projetos que possuam um impacto ambiental positivo. Assim, esses títulos de investimentos de renda fixa(*1) e de iniciativas público privadas, se manifestam em projetos de transição para energia renováveis, eficiência energética, edifícios sustentáveis e transporte com menos emissões de gases do efeito estufa. Quando a pauta é sustentabilidade no mundo corporativo, o foco muitas vezes recai sobre as práticas diárias ESG(*2), enquanto a importância da aplicação de títulos verdes ainda não ganhou muito destaque aos olhos populares. 


Contudo, o ponto de virada para os Green Bonds (GB) foi no ano de 2015, após a conferência COP21(*3) em Paris, na qual as nações formalizaram um acordo conjunto para limitar o aumento da temperatura do planeta em até 2ºC. Apesar de cada país ter se comprometido com as suas metas nas NDCs - Nationally Determined Contributions(*4) - surgiu a necessidade coletiva de financiamento para todos os países. Desse modo, os títulos verdes passaram a ter maior visibilidade, visto que o foco dos investimentos centrou-se na busca de uma economia de baixo carbono sem a perda do desenvolvimento. Sob esse viés, deve-se pensar: qual é o impacto social e financeiro desse instrumento para o mundo dos investimentos?


Ascensão dos Green Bonds 


Os Green Bonds tiveram o seu surgimento no ano de 2007, com quase 600 milhões de dólares por meio de um investimento conjunto do European Investment Bank (EIB) e do World Bank, como forma de suprir uma lacuna de financiamento dos projetos ambientalmente sustentáveis. Dessa forma, foi criado um meio no qual os investidores seriam capazes de apoiar causas como energia renovável, transporte limpo, conservação da água e gestão de resíduos. Sob esse cenário, uma nova forma de diversificação de investimentos foi introduzida ao redor do mundo e, diante de um momento de constante afiliação à sustentabilidade, os títulos verdes ganharam mais valor entre 2015 e 2017. 


Quando fala-se do Brasil, após 8 anos da primeira aparição dos GB no mundo, o país teve os seus primeiros contatos com esse instrumento para a sua emissão em mercados externos através do pioneirismo da BRF(*5) a qual conseguiu captar 500 milhões de euros, o que já fomentou o mercado desde o início. Mesmo sendo uma nação em desenvolvimento que, em teoria, priorizaria investimentos mais conservadores dentro do mercado, o Brasil também busca pela variabilidade dos investimentos e a constante priorização de novas aplicações sustentáveis. 


Dentre seus nichos de aplicação, em escala global, 43% dos títulos em circulação se direcionam ao setor energético, que se configura como o segmento que mais recebe investimentos, seguido por 24% em construções e 12% em transporte. Mesmo buscando esse maior estímulo a essa ferramenta de financiamento, no cenário brasileiro questões políticas e sociais impactam o período de implementação dos GBs na nação comparado com o mercado global, mesmo o país tendo fortes condições de sustentar projetos de sustentabilidade por meio de suas características naturais de solo, recursos hídricos e clima. 


Aplicação e importância 


A partir de todo o conhecimento sobre Green Bonds e a sua exponencial expansão, surge um questionamento: quando comparados com outros investimentos de renda fixa, os títulos são realmente bons ou só tem ganhado esse grande notoriedade pela aprovação da opinião pública e de acionistas na corrida ESG do mundo contemporâneo?


Em linhas gerais, os títulos verdes apresentam vantagens em relação aos títulos convencionais. Para os investidores, oferecem a segurança de que seus recursos estão direcionados para projetos de impacto ambiental. Já para as empresas, possibilitam o acesso a financiamento mais adequado a necessidades dos projetos, incluindo prazos de pagamento mais longos em comparação com empréstimos tradicionais, o que se configura como mais um meio de torná-los atraentes para as empresas. Em contrapartida, existem alguns riscos associados que devem ser ressaltados também, como riscos de liquidez, por poderem ser menos líquidos do que outros títulos de dívida, o que dificulta sua venda no mercado secundário sem afetar seu preço e o risco de mudanças nas regulamentações ambientais e políticas governamentais, que podem afetar os projetos financiados prejudicando diretamente a sua viabilidade econômica e, consequentemente, a capacidade dos emissores de honrar seus compromissos com os investidores. Ademais, esses riscos se centram, fundamentalmente, na possibilidade de uma falta de reputação. Se os projetos financiados pelos GB não entregarem os benefícios ambientais prometidos ou se houver suspeitas de uso inadequado dos recursos, os emissores podem enfrentar danos à sua reputação, o que afeta intrinsecamente a demanda futura por esses títulos e, consequentemente, seu preço de mercado.


No contexto brasileiro, os títulos verdes ainda são pouco explorados, especialmente no impulso à transição para uma economia de baixo carbono, principalmente porque o setor energético aqui no brasil já usa bastante fontes de energias que não dependem de carbono, como hidrelétricas, eólicas e de biomassa. Nesse contexto, o seu uso é mais centrado para um investimento em projetos de menor impacto ambiental, mesmo que não prezam por metas concretas de cuidado ecológico, ou seja, ​​embora os projetos financiados pelos GB possam ser menos prejudiciais ao meio ambiente, eles podem não ter um compromisso claro com a sustentabilidade ou objetivos ambientais concretos. Assim, investimentos priorizados em questões imediatas, como pobreza e infraestrutura precária, combinados com incertezas políticas e regulatórias no âmbito ambiental, somada a escassa conscientização sobre investimentos e lobby(*6) de setores tradicionais, impactam negativamente essa realidade. 


Globalmente, essa realidade é um pouco diferente, com diversos cases de sucesso que fomentam o mercado desses títulos verdes. A Apple é um exemplo marcante de compromisso ambiental, uma vez que já investiu US$ 4,7 bilhões em Green Bonds para impulsionar tecnologias de baixo carbono e projetos de energia renovável. Desde 2016, esses fundos da empresa têm impactado globalmente, reduzindo emissões de CO2 e levando energia limpa a comunidades em todo o mundo. Além de contribuir para a meta da Apple de neutralidade de carbono até 2030, esses esforços estão mitigando milhões de toneladas de CO2 e instalando capacidade significativa de energia renovável, estabelecendo um precedente importante para a sustentabilidade empresarial em escala global. Ademais, a Google adotou uma estratégia semelhante à da Apple, de investimento em energias renováveis, mostrando um movimento crescente em direção a uma economia mais verde e responsável, o que reforça, também, essa rede de influência de multinacionais com o uso de GB.


A pandemia 


O ano de 2020, altamente impactado pela pandemia de Covid-19, começou promissor, mas as restrições impostas interferiram negativamente na emissão de todos os tipos de títulos já em março. Entretanto, mesmo com toda essa incerteza a nível global, o mercado de dívidas sustentáveis continuou obtendo resultados positivos, atingindo um valor recorde de U$269,5 bilhões de dólares no final de dezembro.


Ao analisar os saldos favoráveis dos instrumentos verdes, 2020 também se configurou como um marco para a estruturação de informações fundamentais acerca do mercado de GB e de seu funcionamento, a partir de regulamentações do financiamento e de relatórios de transparência do seu potencial de crescimento. Um destaque desse ano foi o lançamento do Africa Green Bond Toolkit, emitido pelo Banco Africano de Desenvolvimento - instituição financeira multilateral que visa promover os projetos sustentáveis e ambientalmente amigáveis no continente africano - contendo orientações e alinhamentos das melhores práticas e padrões internacionais para a emissão dos títulos. 


Mesmo em um ano pandêmico caracterizado por uma insegurança aguda e pela suspensão de várias atividades, o aumento na confiança no valor das emissões dos Green Bonds foi fruto não só de um aumento na conscientização e no incentivo governamental, como também devido à crescente demanda dos investidores e da taxa de juros competitiva, com a consequente maior participação de diversos mercados e diversificação de emissores. Uma exemplificação desse destaque no período de isolamento centra-se em uma pesquisa da BloombergNEF de 2020 que analisou que 52% dos investidores institucionais globais planejavam aumentar seus investimentos em títulos verdes nos próximos cinco anos, acreditando no seu impacto ambiental e econômico para o ganho capital e social das empresas.


Contudo, enquanto os mercados desenvolvidos apresentaram um aumento, no volume global de Green Bonds, de 73% para 80% em 2020, os mercados emergentes apresentaram uma queda de 22% para 16%. A priori, essa queda pode parecer a descrença no investimento sustentável, entretanto, ela é o reflexo da busca pela segurança dos investimentos diante de um cenário pandêmico nunca antes visto pelos atuais investidores. Ainda assim, o mercado de dívida sustentável da América Latina & Caribe (ALC), por exemplo, cresceu e bateu recorde de Títulos Verdes, Sociais e Sustentáveis (VSS), com o valor de 16,3 bilhões de dólares em 2020, representando um aumento de 82% comparado ao ano anterior.


Além disso, embora três dos dez países do ranking com maiores emissões desses financiamentos verdes sejam considerados desenvolvidos, diversas economias emergentes, com destaque ao da China, provam que os países em desenvolvimento também procuram um futuro limpo e verde, buscando atingir um mercado de ativos verdes fortemente aquecido. 


Análise de indicadores gerais 


Para entender mais profundamente o impacto dos títulos verdes no desempenho financeiro da empresa, uma pesquisa desenvolvida pelo Green Bond Transparency analisou companhias de capital aberto que emitiram esses instrumentos entre os anos de 2015 e 2020. Ao examinar indicadores globais como ROA(*7) - Retorno Sobre Ativos - e ROE(*8) - Retorno sobre o patrimônio - ambos tiveram impacto positivo, com uma média de 2.53 e de 5.91, respectivamente, que, no quadro de análise são parâmetros positivos, maiores que antes da prática de emissão desses capitais sustentáveis. Apesar de uma ligeira melhoria, a emissão de títulos verdes não teve um impacto estatisticamente significativo no desempenho financeiro das empresas brasileiras no ano seguinte, possivelmente devido ao caráter de longo prazo dos investimentos ambientais associados a esses títulos.


Outras variáveis de controle do modelo, como a Margem Líquida(*9) e Margem EBITDA(*10) também apresentaram coeficientes positivos, o que indica uma relação das margens de lucro da empresa. Esse modelo de performance torna mais notória a participação com esses títulos, o que contribui, cada vez mais, para uma transição de financiamentos e um maior foco de investimentos no âmbito ambiental dos países, principalmente demonstrando o saldo positivo do retorno dos investimentos e o retorno do patrimônio das empresas que emitem títulos verdes.


Desafios para o futuro 


A partir desse cenário, entende-se que o fenômeno de títulos verdes apresenta um impacto significativo nos investimentos e está ganhando, cada vez mais, notoriedade no mundo da "corrida ESG". Entretanto, torna-se essencial entender algumas travas e desafios que essa iniciativa encontra no nicho. Em primeira instância, ainda não existe um acordo formal legislativo e claro sobre o que constitui um título verde, o que interfere diretamente na confiabilidade das operações ditas sustentáveis, prática altamente associada à ocorrência do Greenwashing(*11), por exemplo.


Em adição, essas obrigações verdes também necessitam de uma melhor comunicação com o quadro de investidores dessa modalidade, visto que ainda há pouco conhecimento do funcionamento desses títulos, seus custos, riscos e benefícios. Assim, essa desmistificação poderia ajudar a ampliar a base de investidores interessados e acelerar grandes projetos, como o desenvolvimento de novas infraestruturas energéticas nos países em transição energética. Trata-se, evidentemente, de uma tendência que necessita ser contornada rapidamente para que a penetração desse instrumento de capital possa ser cada vez maior, contribuindo no desempenho financeiro e sustentável do mundo.  


Glossário: 

  1. Investimentos de renda fixa: segmento de financiamento no qual o investidor empresta dinheiro a instituições em troca de uma remuneração fixa pré definida, como títulos públicos.

  2. ESG - são critérios não financeiros que avaliam o desempenho de uma empresa em áreas como meio ambiente, responsabilidade social e governança.

  3. COP21 - 21ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, na qual países concordaram em um acordo para limitar o aquecimento global abaixo de 2°C em relação aos níveis pré-industriais.

  4. Nationally Determined Contributions - compromissos que os países assumem para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, contribuindo para a mitigação das alterações climáticas.

  5. BRF - se configura como uma das maiores empresas de alimentos do mundo, focalizada por sua atuação na produção e comercialização de proteínas de origem animal, que possui sede no Brasil.

  6. Lobby - influência de grupos tradicionais sobre políticas públicas, impactando negativamente investimentos em áreas como pobreza e infraestrutura.

  7. ROA - índice de retorno sobre o ativo total, utilizado como variável dependente de desempenho financeiro.

  8. ROE - índice de retorno sobre o capital investido, utilizado como variável dependente de desempenho financeiro.

  9. Margem Líquida - corresponde à porcentagem do lucro líquido em relação à receita total, mostrando a eficiência da empresa em gerar lucro após despesas.

  10. Margem Ebitda - representa a porcentagem do lucro operacional em relação à receita total, excluindo juros, impostos, depreciação e amortização.

  11. Greenwashing - formato de marketing em que a promoção de atividades "verdes" e sustentáveis são usados ​​​​de maneira enganosa para convencimento do público.


Referências Bibliográficas: 


BAKER, Malcolm et al. Financing the response to climate change: The pricing and ownership of US green bonds. National Bureau of Economic Research, 2018. 


GOMES, Túlio Gonçalves; BORSATTO, Jaluza ; ARAÚJO, Aracy Alves. Títulos Verdes e Desempenho: uma análise das empresas brasileiras de capital aberto. Revista de Ciências da Administração, v. 24, n. 62, p. 140–151, 2022.


KOHN, Stephanie. As entrelinhas dos títulos verdes. Meusite. Disponível em: <https://www.economeaning.com.br/post/as-entrelinhas-dos-t%C3%ADtulos-verdes-news-3>. 


OLIARI, Reinaldo ; SANTOS, Raquel . Green bonds e o contexto brasileiro | Deloitte Brasil. Deloitte Brazil. Disponível em: <https://www2.deloitte.com/br/pt/pages/audit/articles/green-bonds.html>. 


PROPAGUE. Green bonds: o que são e como esses títulos ajudam na transição verde. institutopropague.org. Disponível em: <https://institutopropague.org/financas-verdes/green-bonds-o-que-sao-e-como-esses-titulos-ajudam-na-transicao-verde/>.


SANGIORGI, Ivan; SCHOPOHL, Lisa. Why do institutional investors buy green bonds: Evidence from a survey of European asset managers. International Review of Financial Analysis, v. 75, p. 101738, 2021.  


ZERBIB, Olivier David. The effect of proenvironmental preferences on bond prices: Evidence from green bonds. Journal of Banking & Finance, v. 98, p. 39-60, 2019.


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