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Storytelling com dados: qual é a sua história?

Foto do escritor: Felipe de Oliveira PontesFelipe de Oliveira Pontes

Independente do tema, a habilidade de contar uma história pode tornar as ideias mais atraentes. Acrescentando ainda o uso de dados, a técnica de storytelling¹, contar histórias, em tradução livre, se expande e conecta três mundos distintos: a ciência, os negócios e a arte. Nesse sentido, consultores, analistas ou empreendedores poderiam utilizar essa conexão para reforçar o conteúdo a ser transmitido, contudo, na maioria das vezes, não o fazem. A aplicação do storytelling com dados não é tão natural e, por isso, transmitir uma mensagem clara, linear e esteticamente atraente é um diferencial no mercado, destacando aquelas pessoas que sabem, por meio de simples conceitos, transformar fatos e estatísticas em boas histórias.


A elaboração de uma história


A necessidade de incluir informações estatísticas em favor de um propósito comercial é cada vez mais comum em quaisquer ambientes profissionais. No entanto, aprender a lidar com dados de forma narrativa, atualmente, não faz parte da formação acadêmica tradicional. À primeira vista, a arte de contar histórias parece infantil demais para ser valorizada, intuitiva demais para ser ensinada e clara o suficiente para deixar de ser aplicada. Porém, na realidade, muitas apresentações não envolvem o espectador, justamente, por esse déficit na preparação, gerando tédio, desinteresse e fuga de atenção.


Nesse caso, muitas vezes, o problema não está no conteúdo: há fatos e dados, mas, mesmo assim, não se gera convencimento. Então, por que é tão difícil conquistar um público com algo que está correto? Existem várias razões pelas quais a exposição com dados pode falhar. Segundo Cole Nussbaumer Knaflic, ex-diretora de People Analytics² da Google, os fatores de uma apresentação podem ser sintetizados no contexto, no visual e na história.


  • Contexto:


De início, é fundamental entender dois pilares do cenário comunicativo: “quem” e “o que”. Nessa perspectiva, o “quem” determina o público alvo, visando a produzir a mensagem de acordo com os seus interesses. Já o chamado “o que” se trata da resposta que se deseja produzir nos espectadores. Ou seja, tudo o que se adicionar na fala deve cumprir esse desejo de direcionamento, de maneira clara e objetiva.


  • Visual:


Aceitar a responsabilidade artística da elaboração colabora para a transmissão eficaz do conteúdo. O design deve ser atrativo e auxiliar no propósito final da apresentação, de forma a destacar os principais elementos e a direcionar favoravelmente o pensamento do público. Entretanto, cabe atentar-se sempre para não poluir o layout com alguns elementos desnecessários, os quais serão especificados mais adiante.


  • História:


Construir um clássico “início-meio-fim”, conjugando sempre o que é falado com o que é apresentado. Trabalhando com linearidade, começa-se por uma trama inaugural com fatos de aceitação comum, desencadeando em um conflito a ser resolvido. Durante o andamento, é recomendado que se incluam dados que situem o problema, apontando consequências caso nenhuma ação seja tomada. Por fim, é importante apresentar uma solução coerente com o fluxo da narrativa, de forma a tornar claro também o que o público deveria fazer com o que fora absorvido.


Storytelling e a consultoria


Para os serviços de consultoria, uma boa história é contada de maneira diferente. Normalmente, consultores das principais empresas do mundo tendem a estabelecer uma comunicação baseada em Answers First³, visto que os clientes, os alvos da mensagem, precisam mais das respostas do problema do que dos meios de resolução. Dessa forma, essa estrutura comunicativa mostra-se muito eficiente, sobretudo quando a confiança do público não precisa ser conquistada, permitindo que o apresentador seja objetivo.


Nesses casos, então, a fim de adequar a apresentação aos interesses dos clientes, primeiro é dito o que se deve fazer, depois o porquê e, por último, os dados que sustentam essa análise. Essa abordagem refere-se ao Princípio da Pirâmide, proposto por Barbara Minto, uma das primeiras figuras femininas a se destacar como consultora, ainda nos anos 60, na McKinsey & Company.


Além disso, gerar inspiração e envolvimento contando histórias configura uma capacidade de liderança fundamental para a consultoria. “Storytelling é vital para o papel de líder, sendo ele responsável por motivar, alinhar e direcionar a visão de uma equipe” - aponta Carolyn Dewar, Senior Partner e coordenadora da formação de CEOs da McKinsey. Assim, a capacidade de contar histórias mostra-se importante tanto na relação com clientes, quanto com os colegas de trabalho.


Saturação e recursos pré-atentivos


Advém da psicologia um conceito vital para o storytelling com dados: a carga cognitiva. Estudada pelo psicólogo educacional australiano John Sweller, a Teoria da Carga Cognitiva reafirma a capacidade limitada do cérebro de armazenar informações a curto prazo. Por esse motivo, a adição de elementos desnecessários em um gráfico reduz a chance da mensagem central ser captada. Nesse contexto, os excessos visuais indesejáveis são definidos como saturações e precisam ser eliminados.


De maneira geral, a remoção de alguns vícios clássicos auxilia na qualidade da comunicação. Exemplificando isso, o guia “Storytelling with Data”, de Cole Nussbaumer Knaflic, demonstra que elementos como bordas, linhas de grade, sombreados e textos na diagonal desviam dos dados a atenção, atrasando a leitura e frustrando a interpretação. Portanto, tendo em vista que cansar o público é um grande inimigo da eficiência comunicativa, é preciso respeitar as limitações do cérebro humano e preservar no visual somente o essencial.


Assim, visando a direcionar a atenção do público, o storytelling ideal com dados conta também com algumas ferramentas visuais de foco. Chamados pré-atentivos, esses recursos apontam destaques antes mesmo de o espectador ter sua própria interpretação. Com esse fenômeno, é natural o olhar ser desviado primeiramente para letras em negrito, objetos maiores ou cores em evidência, por exemplo. Sabendo disso, uma narrativa é bem construída ao redor de um gráfico quando se tem consciência sobre o que remover, o que destacar e quando destacar.


Desenvolvimento de um visual com storytelling


Para explicar, com um exemplo, a construção do storytelling com dados, supõe-se a existência de três empresas concorrentes - A, B e C -, as quais compartilham publicamente as receitas anuais. Nesse contexto, em uma apresentação de divulgação da empresa B, pretende-se apontar o crescimento acentuado nos últimos anos, sobretudo pela boa adaptação frente ao cenário de pandemia. Então, a partir do visual problemático abaixo, há de se identificar as falhas e promover melhorias para destacar a performance da empresa B, como desejado.


  • Visual inicial - deficitário:


Inicialmente, é fácil reconhecer uma série de deficiências que impedem o público de enxergar com clareza o que se deseja expressar. A começar pelo tipo de gráfico, a troca das colunas por linhas cumpriria melhor o propósito de observar tendências, que é justamente o que valoriza a companhia B nos últimos anos. Paralelamente, o destaque dado ao título e à unidade de medida é exagerado e não colabora com o objetivo estabelecido com os dados.


Além disso, há pouco cuidado com preceitos básicos da visualização de gráficos. Em relação à saturação do visual, por exemplo, destaca-se negativamente as linhas de grade, a legenda em diagonal e a escala de cor pouco diferenciável, a qual não realça a principal empresa da análise. Assim, todos esses fatores criam distrações para o leitor, desviando a atenção da mensagem central: o crescimento da empresa B.


Tendo tudo isso em vista, portanto, realiza-se a reformulação abaixo. Agora em um gráfico de linhas, procura-se comunicar diretamente o propósito do visual, a partir de um action title4 no topo. São acrescidos ainda recursos pré-atentivos, como as receitas de 2022, que servem para comparar o estágio atual da concorrência, dando destaque à B. Assim, a transmissão da ideia é facilitada pelo uso do storytelling com dados.


  • Visual final - com storytelling:


Ética e storytelling com dados


Como contador(a) de histórias, é preciso ter muita responsabilidade na preparação dos gráficos. Esconder dados relevantes ou forjar amostras são práticas que ferem princípios morais e não devem jamais ser cogitadas pela ética inerente ao storytelling com dados. Assim, contar uma história com informações falsas é nocivo em qualquer contexto, não só para o público, como também para o próprio elaborador, que coloca sua credibilidade em risco.


Em suma, as práticas ideais do storytelling com dados não devem nunca ser associadas à manipulação. Trata-se de um passo a passo para tornar, de maneira honesta, as apresentações mais visuais e direcionadas para o propósito central. Só assim, eliminando as saturações e chamando a atenção para aquilo que importa, é construída uma história verdadeira e envolvente a partir de estatísticas.


Então, mostrada a valiosa relação da comunicação com o preparo criterioso do visual gráfico, é hora de passar a vez: qual é a sua história?


Glossário:


1- Storytelling: Trata-se da habilidade comunicativa de envolver o receptor com uma ideia, a partir de uma trama que seja planejadamente estimulante. Tais técnicas são usadas na arte há anos de forma instintiva pelas civilizações humanas, porém, atualmente, há grande utilidade para o storytelling em outros contextos, como os negócios.


2- People Analytics: Setor empresarial que trabalha com dados e é responsável por analisar contratações e funcionários atuais, além de pensar como promovê-los enquanto profissionais.


3- Answers First: Respostas primeiro, em tradução literal. É um método que tem como regra comunicar, primeiramente, a resposta dos problemas e depois explicá-la.


4- Action Title: Título do visual que condensa a mensagem a uma ou duas sentenças. É um recurso muito útil para a consultoria, sobretudo por ser aliado do princípio de Answers First.


Referências:


Gallo, C: Storytelling Is A ‘Foundational’ Leadership Skill, According To McKinsey. Forbes, 2022. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/carminegallo/2022/06/29/storytelling-is-a-foundational-leadership-skill-according-to-mckinsey/?sh=44142bfb3b99. Acesso em jan. 2023.


Knaflic, C; Storytelling com Dados: um guia sobre visualização de dados para profissionais de negócios, Editora Alta Books, 2019.


Minto, B; O Princípio da Pirâmide, Editora Canal Certo, 2011.


Moss, P: PowerPoint Storytelling: How McKinsey, Bain, and BCG use the SCQA framework to create elite presentations. Analyst Academy, nov. 2021. Disponível em: https://www.theanalystacademy.com/powerpoint-storytelling/. Acesso em jan. 2022.


Santos; L: A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA TEORIA DA CARGA COGNITIVA EM UMA EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - CINTED, 2007. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/renote/article/download/14145/8082. Acesso em jan. 2023.




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