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A volta para o escritório: será o fim do home office?

Atualizado: 4 de mar.



Home office corresponde à prática de uma pessoa trabalhar da sua casa ou de algum espaço alternativo fora da estrutura convencional de uma organização. Durante a pandemia, essa nova forma de trabalhar proliferou-se como o principal meio de viabilizar que uma gama de atividades continuasse a ser realizada, sobretudo diante do fechamento de postos de trabalho e do isolamento social. Entretanto, a nova realidade que muitos já acreditavam ser definitiva nas organizações tem sofrido movimentos contrários que trazem os funcionários novamente para o escritório, como é visto no caso da BigTech¹ americana Amazon, assim, criando dúvidas acerca da eficiência desse modelo. 


O Boom no cenário pandêmico 


Em 1978, a pioneira americana em computação IBM foi a primeira a adotar o home office dentro do ambiente empresarial. Nesse sentido, essa prática expandiu-se, sobretudo após a década de 90, à medida que o acesso aos computadores e à internet foi popularizado, enquanto que, no Brasil, tal forma de trabalho só foi regulamentada em 2017 permitindo, assim, o seu avanço em território nacional. 


Nesse sentido, diante da crise do COVID-19 e do fechamento temporário de estabelecimentos não essenciais, o teletrabalho, que antes apresentava crescimento linear e moderado, teve um boom e tornou-se a principal alternativa para manutenção de empregos, além de permitir o funcionamento de diferentes setores da economia. Com isso, esse cenário, de acordo com um estudo da Universidade de Stanford realizado em 2021, acelerou o desenvolvimento dessa prática, indo de uma estimativa de 30 anos para apenas 1 nos anos pós-pandemia.


A evolução acelerada desse formato acarretou benefícios, como diminuição dos custos e aumento da produtividade, porém também gerou complicações relacionadas, por exemplo, à escassez de leis trabalhistas e à proteção dos dados das empresas.  


Reflexos nos custos e na produtividade das empresas


O surgimento da pandemia de Covid-19 e a rápida adoção do trabalho remoto ocorreram de maneira súbita e imprevista. Os resultados positivos alcançados em curto prazo, a partir da transição para um novo paradigma nas relações profissionais, é refletido na preferência dos empregadores, os quais 3 em cada 4 escolheram manter uma parcela de seus funcionários trabalhando remotamente apesar do fim da crise sanitária.


Dentre os efeitos positivos que a saída do trabalho formal dos escritórios permitiu, destaca-se a redução dos custos atrelados a três principais fatores:  

  1. Despesas operacionais: O aluguel dos espaços físicos em grandes cidades sofreu uma diminuição significativa, tendo em vista que muitas empresas possuem equipes trabalhando integral ou parcialmente de forma remota, permitindo que os ambientes sejam menores. Além disso, também há redução nos gastos atrelados à manutenção, à limpeza e aos materiais de escritório. Por exemplo, uma beneficiada dessa situação foi a empresa de tecnologia IBM, que obteve uma economia de US$ 50 milhões em despesas imobiliárias, segundo dados fornecidos pela Global Workplace Analytics.

  2. Absenteísmo²: De acordo com a Global Workplace Analytics, ausências não programadas custam aos empregadores US$ 1.800/funcionário anualmente. Nesse sentido, a flexibilização do modelo de trabalho permite que o colaborador continue a trabalhar ou retorne ao trabalho mais rapidamente, dada a diminuição do esforço e dos riscos atrelados. Assim, há uma queda expressiva no número de faltas e consequente despesas associadas a elas.


3. Retenção de funcionários: Segundo o FlexJobs, aproximadamente 57% dos profissionais pensam em abandonar seu emprego atual, caso a empresa onde trabalham deixe de oferecer a opção de trabalho remoto. Essa porcentagem destaca o valor que os funcionários atribuem aos benefícios proporcionados pelo trabalho à distância, como maior flexibilidade, e que a não adoção dessa metodologia pode causar uma queda imediata da força de trabalho, além de gerar mais custos para recrutar e treinar novos funcionários.



O aumento da produtividade é analisado sob a perspectiva de que, por estar em um ambiente isolado, as distrações são reduzidas. Somado a isso, pelo ganho do tempo que seria utilizado para a locomoção, de acordo com uma pesquisa da Universidade de Harvard, os funcionários tendem a trabalhar em média 50 minutos a mais quando realizam suas tarefas remotamente. Dessa forma, o tempo economizado nos transportes se reflete em horas produtivas, além de gerar um aumento da satisfação do colaborador. Por fim, por expandir a possibilidade de contratação de funcionários não residentes da cidade onde a empresa se localiza, aumenta-se a atração de novos talentos.



Todavia, deve-se ressaltar que, para além de uma visão macro que destaca o crescimento do desempenho dos funcionários, analisando individualmente diferentes setores, observa-se que houve casos, como o setor de serviços, onde colaboradores e empregadores identificaram diminuição na produtividade. Tais exemplos podem estar relacionados à natureza das atividades realizadas ou à falta de infraestrutura tecnológica para manter o funcionamento remoto da organização. 


Em suma, a redução de custos atrelada ao aumento da produtividade permite maximizar o desempenho financeiro das empresas, sendo assim um mecanismo adotado amplamente.


A volta para o escritório 


Na contramão dessa tendência, em meados de 2023, a Amazon anunciou a obrigatoriedade de que seus funcionários estejam presentes ao menos três vezes na semana nos escritórios. Esse processo foi seguido por outras empresas de diversos setores, como Google e Zoom, as quais fizeram o mesmo trajeto e passaram a incentivar os profissionais a retornarem para os espaços de trabalho presenciais.



Nesse sentido, dentre as justificativas apontadas, há o fato de que muitas dessas organizações estão diante de um momento econômico desafiador, como a Amazon, a qual enfrentou uma queda de cerca de 50% das ações da companhia,, perdendo quase US$ 1 trilhão em valor de mercado no processo. A partir desse cenário, a empresa passou a adotar medidas austeras para adaptar-se frente a uma economia incerta, como a demissão de 18 mil funcionários e a exigência do retorno ao regime presencial. Com isso, é possível observar que uma grande parcela dessas empresas optam por voltar para o formato presencial nesses cenários, pois possuem políticas de gestão melhor estruturadas e que permitem que as equipes sejam acompanhadas de forma mais próxima.  


Apesar de ser destaque em relação à produtividade, tratando-se de home office, a interação com os demais funcionários também é prejudicada, dado que a comunicação fica restrita aos canais digitais e chamadas de vídeo. Dessa forma, de acordo com uma pesquisa da companhia WeWork, a troca entre diferentes indivíduos tende a ser reduzida em 11%, afetando a longo prazo o caráter inovador e a propagação da cultura da empresa, como aponta o psicólogo organizacional da Universidade de Stanford, Robert Sutton. 


Nesse sentido, também foi verificado que as chances de promoção são reduzidas à metade quando trabalhadores remotos são comparados aos que atuam presencialmente. De acordo com um trabalho acadêmico de Stanford de 2015, tal panorama deve-se ao fato de que as pessoas que não estão no ambiente de trabalho não constroem relações e habilidades de gestão tão rapidamente ou não possuem a chance de demonstrar essas habilidades. Além disso, o estudo também destaca que quando os responsáveis pelas promoções não interagem pessoalmente com os colaboradores remotos, já que estes ficam “fora do alcance visual” e, mesmo que possuam entregas em quantidade e qualidade superior aos que comparecem presencialmente, são desfavorecidos na avaliação de opções para ocupar cargos mais elevados. Tal problemática se desdobra na possibilidade da redução da diversidade nesses espaços, visto que os mais suscetíveis a estarem nos escritórios são homens solteiros e com ensino superior. 



Efeitos da “nova forma de trabalhar”


A adoção de um regime híbrido permite a mescla das qualidades de ambos os sistemas, porém novas demandas surgem e exigem a atenção dos gestores nos recentes ambientes de trabalho. Dentre os principais efeitos provenientes desse novo paradigma nas relações profissionais, há: 


  1. Alteração no espaço físico dos escritórios: a distribuição dos escritórios também sofreu alteração com a volta dos funcionários. Antes da pandemia, espaços abertos e que priorizavam sobretudo a colaboração eram comuns, todavia, após o período de isolamento social e atividades sendo realizados à distância, verifica-se que os trabalhadores passaram a valorizar espaços individuais, que permitam a realização de suas atividades com menos distrações. Assim, ambientes com mix de áreas abertas e privadas, integrando “cubículos” e espaços de convivência, permitem atender as necessidades remanescentes do home office com os benefícios do trabalho presencial, pautados sobretudo pelo maior número de interações e colaborações entre diferentes setores e funcionários. 

  2. Legislação: Diante da expansão do ambiente de trabalho para além dos escritórios, também foram necessárias alterações em legislações trabalhistas, envolvendo regulamentações sobre o controle de jornada, a responsabilidade pela infraestrutura necessária ao trabalho remoto, a garantia da saúde e segurança do trabalhador em ambiente domiciliar, além de diretrizes sobre reembolso de despesas relacionadas ao trabalho remoto. Por exemplo, a alteração no artigo 75 da CLT, que permite a alteração do regime de teletrabalho para presencial, garantindo um prazo mínimo de 15 dias para a transição. 

  3. Segurança de dados: O trabalho home office trouxe desafios adicionais para a segurança de dados, aumentando o risco de violações. A exposição a redes não seguras, o uso de dispositivos pessoais para trabalho e a comunicação por meio de canais menos seguros podem resultar em vulnerabilidades para as companhias. Dessa forma, as empresas têm buscado reforçar políticas de segurança, promovendo treinamentos, implementando medidas de criptografia e monitoramento para mitigar esses riscos.


O futuro do home office  


Nessa ótica, é possível observar que apesar do home office oferecer vantagens, como a flexibilidade, a interação pessoal e oportunidades de promoção são aspectos comprometidos, destacando a necessidade de uma abordagem híbrida que integre o melhor de ambos os mundos e permite potencializar os pontos positivos presentes no home office e no presencial. O futuro do trabalho direciona-se para uma configuração flexível, demandando adaptações legislativas e medidas de segurança robustas para enfrentar os desafios emergentes nesse novo cenário laboral.

Assim, observa-se que, apesar de “voltar algumas casas” em relação às intensas mudanças que ocorreram durante a pandemia, a criação de formas alternativas de trabalho e a flexibilização dos serviços representam uma transformação irreversível em como os indivíduos visualizam as possibilidades de realizar suas atividades. 


 Glossário


1 - Bigtech: Grandes empresas de tecnologia que desempenham um papel dominante no setor

2 - Absenteísmo: Prática de funcionários faltarem ao trabalho de maneira regular ou excessiva, seja de forma justificada ou injustificada


Referências


MUDANÇAS OCORRIDAS NA LEGISLAÇÃO DO TELETRABALHO PÓS PANDEMIA DO COVID-19 – ISSN 1678-0817 Qualis B2. Revistaft.com.br. Disponível em: <https://revistaft.com.br/mudancas-ocorridas-na-legislacao-do-teletrabalho-pos-pandemia-do-covid-19/#:~:text=A%20CLT%20tamb%C3%A9m%20sofreu%20altera%C3%A7%C3%B5es,14.400%2C14356%2C14348%20entre%20outras>. Acesso em: 26 jan. 2024.


MATTIOLI, Dana ; TOONKEL, Jessica. Amazon Layoffs to Hit Over 18,000 Workers, the Most in Recent Tech Wave. WSJ. Disponível em: <https://www.wsj.com/articles/amazon-to-lay-off-over-17-000-workers-more-than-first-planned-11672874304?mod=djemalertNEWS>. Acesso em: 26 jan. 2024.

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