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Marvel: dos quadrinhos à maior franquia da história dos cinemas

Atualizado: 17 de mai. de 2023


Homem de Ferro. Capitão América. Homem-Aranha. Esses nomes se referem a super-heróis muito conhecidos mundialmente e que, por trás de histórias emocionantes e repletas de aventuras, apresentam uma característica em comum: foram criados pela Marvel Comics. Durante muito tempo, a Marvel se dedicava, majoritariamente, aos quadrinhos, porém, no início dos anos 2000, alguns de seus personagens passaram a ganhar espaço nas telas dos cinemas, apresentando números de bilheterias extremamente elevados. Dessa forma, faz-se necessário compreender os motivos que levaram a editora a alcançar esse patamar expressivo.


Como tudo começou


Em 1939, a Marvel Comics, uma editora norte-americana de mídias relacionadas, surgiu como uma criação de Martin Goodman, com um enfoque direto na criação de histórias em quadrinhos. Entretanto, a companhia nem sempre foi conhecida como Marvel, sendo inicialmente chamada de Timely Comics. A primeira revista da empresa foi publicada naquele mesmo ano, apresentando os primeiros personagens: o Tocha Humana, futuro integrante do Quarteto Fantástico (um dos sucessos da firma), e o Namor, Príncipe Submarino, o qual, recentemente, ganhou uma adaptação paras as telonas no filme Pantera Negra: Wakanda para Sempre.

Aproveitando a Era de Ouro dos Quadrinhos¹, a então Timely Comics não demorou muito para estourar. Em 1941, Joe Simon, primeiro editor da companhia, e o desenhista Jack Kirby criaram o icônico Capitão América, um dos mais conhecidos personagens do Universo Marvel. O grande êxito desse super-herói se deu, principalmente, pelo fato de personificar o patriotismo ianque², algo muito forte nos EUA durante meados do século XX. Além disso, o componente político, embora tenha se atenuado com o passar dos anos, era muito forte nas primeiras aventuras do personagem, visto que seu primeiro inimigo da ficção foi, justamente, o Caveira Vermelha, um supervilão nazista.


Dando continuidade ao legado de Simon, o qual deixou a empresa ainda em 1941, Goodman tornou Stan Lee, primo da sua esposa e auxiliar do escritório, o principal editor da firma. Com isso, é inegável que Lee deu conta do recado, dando início à criação de personagens marcantes desse universo como, por exemplo, o Homem-Aranha, os X-Men, o Incrível Hulk e o Homem de Ferro, o que estabeleceu seu nome na história da indústria.


Contudo, não se pode afirmar que esse sucesso conseguiu superar os impactos da crise durante a década de 1950. Nessa época, o mercado de quadrinhos sobre super-heróis foi extremamente prejudicado, devido ao sucesso de outras temáticas de revistas como, por exemplo, horror, humor, faroeste etc. Dessa maneira, a Marvel não teve escolha a não ser manter um foco maior em projetos que englobassem histórias relacionadas aos assuntos em alta naquele momento. Dentre essas produções, destaca-se “Homer: O Fantasma Feliz”, uma revista em quadrinhos mais infantil e humorística.


Apesar do período turbulento por conta das consequências da guerra, durante a década de 1960, com o auxílio de Stan Lee, roteirista e editor-chefe na época, a Marvel ganhou reconhecimento através de HQs como o Quarteto Fantástico, o Espetacular Homem-Aranha e o Demolidor. A partir disso, suas histórias e heróis passaram a se aproximar mais da realidade, já que elas não só aconteciam em lugares reais, adotando Nova Iorque como principal cenário, mas também, retratavam personagens com vidas normais, que apresentavam problemas comuns do cotidiano.


A Falência da Marvel


Depois do sucesso dos quadrinhos nas décadas de 1960 até 1980, a Marvel foi adquirida por Ron Perelman, um bilionário da indústria de cosméticos, que pagou $83 milhões de dólares pela companhia em 1989. No entanto, o objetivo de Perelman passava longe dos quadrinhos, uma vez que seu foco era o de transformar a firma em uma geradora de merchandising³, tornando-a uma das maiores empresas de cartões colecionáveis. Além disso, outras tentativas foram tomadas, como a produção em massa de novas revistas ou forçar um aumento de preços para atender o público de colecionadores.


O aumento de preços realizado por Perelman obteve resultado e a empresa conseguiu gerar lucro. Contudo, a Marvel passou a tomar decisões que, futuramente, trariam graves consequências, como, por exemplo, a emissão de junk bonds - títulos de dívida considerados ativos financeiros de baixa qualidade, por existir uma boa chance de inadimplência do emissor do papel. Além disso, Perelman estava abrindo holdings⁴ para distribuir perdas operacionais e reduzir os requisitos de pagamento de impostos, a fim de reduzir impactos tributários e facilitar o acesso a empréstimos. Entretanto, esses conjuntos de empresas se tornaram garantias sobre as quais ele emitia junk bonds adicionais. Por fim, outro ponto que trouxe prejuízos para a Marvel foi o êxodo de profissionais criativos para a recém-criada Image Comics em 1992, afetando a qualidade das histórias em quadrinhos da companhia.


Dessa maneira, todos esses aspectos culminaram na falência da corporação, que se afundou em dívidas no ano de 1993. Todavia, o que não se esperava era que, apesar das dificuldades financeiras, a firma viria a se tornar uma das maiores indústrias da história do cinema do século XXI.


O início do Universo Cinematográfico Marvel (UCM)


Nessa conjuntura, a principal dúvida era: como se tornar lucrativa novamente? As opiniões eram bastante divergentes e os primeiros planos para gerar renda se provaram ultrapassados. Dentre eles, se destacavam restaurantes temáticos, discos interativos e figurinhas, os quais falharam em reerguer a empresa. Contudo, houve uma tentativa bem-sucedida na época, que foi a venda dos direitos de sagas para outros estúdios. Assim, produções como Blade, O Caçador de Vampiros, X-Men: O Filme, e Homem-Aranha tornaram o gênero de filmes de super-heróis popular novamente, porém a Marvel não estava aproveitando esse momento, pois havia comercializado esses direitos.


Sendo assim, em 2003, David Maisel, produtor de filmes norte-americano, percebeu a grande oportunidade que a companhia estava deixando passar, uma vez que não fazia sentido continuar vendendo o seu maior potencial de lucro para outros estúdios. Consequentemente, o plano de criar um estúdio de cinema para produzir os filmes da Marvel começou a ser elaborado. Com isso, a empresa estava, enfim, conseguindo algum lucro e, dois anos depois, Maisel foi contratado como presidente da Marvel Studios, concebendo o modelo financeiro que tornou a reformulação possível.


Essa estrutura consistia, basicamente, em uma grande aposta, a qual visava a garantir um financiamento por sete anos da Merrill Lynch, banco norte-americano de investimentos e provedor de outros serviços financeiros, de $525 milhões de dólares, o qual permitiria a criação do estúdio. Como garantia, a Marvel arriscou os direitos de 10 de seus personagens: Capitão América, Os Vingadores, Nick Fury, Pantera Negra, Homem-Formiga, Manto & Adaga, Doutor Estranho, Gavião Arqueiro, Quarteto Futuro e Shang-Chi. Portanto, caso o plano da firma falhasse, eles teriam perdido os direitos de todos esses personagens e o UCM que conhecemos hoje seria apenas uma ideia promissora.


Nesse contexto, durante o ano de 2008, o primeiro filme do UCM foi lançado: Homem de Ferro. O longa-metragem foi financiado com o dinheiro investido pelo banco, custando $140 milhões de dólares em valores da época. A situação era precária, já que, aparentemente, mais de 30 roteiristas recusaram o projeto pela pressão de tornar popular um personagem tão obscuro, uma vez que ele era alcoólatra e tinha um estilo de vida polêmico. No entanto, contrariando algumas expectativas, a produção foi um sucesso absoluto - o filme arrecadou cerca de 585 milhões de dólares em bilheteria - e, após algumas tentativas, a companhia readquiriu os direitos sobre os personagens que estavam sendo utilizados como garantia.


A aquisição feita pela Disney


Um ano depois do lançamento do primeiro filme, a Walt Disney Company comprou a Marvel por $4,3 bilhões de dólares – muito mais do que ela teria valido cinco anos antes, porém, muito menos do que ela viria a valer. Apesar do que se imagina, o motivo da venda não foi falência ou algo do tipo, mas, sim, uma negociação pensada no futuro da empresa. Afinal, a partir de então, a firma não precisaria mais criar de maneira independente os seus filmes, contando com a ajuda de um grupo gigantesco e de referência no ramo. Dessa forma, o projeto se tornou um dos mais bem sucedidos da história do entretenimento.


Desde então, os filmes da Marvel vêm marcando a história do cinema mundial, visto que contam com uma legião de fãs, os quais fazem questão de comparecer às pré-estreias e acabam trazendo um grande retorno financeiro para a firma. Por esse motivo, é possível observar que quatro das dez maiores bilheterias da história do cinema mundial pertencem ao UCM, deixando claro o sucesso do plano de venda, que foi capaz de combinar a genialidade dos editores e produtores da Marvel Comics com os efeitos especiais e a ótima direção da Walt Disney Company.


A entrada no mundo dos streamings


O Universo Cinematográfico Marvel não se restringe, somente, aos filmes. Séries como "Agentes da SHIELD”, “WandaVision” e “Loki” agem como uma ligação entre as adaptações para o cinema, se aprofundando em fatos que foram abordados superficialmente ou que nem chegaram a ser comentados nos filmes, enriquecendo ainda mais o universo compartilhado.


A Netflix, um dos principais canais de streaming⁵ da atualidade, foi a primeira a produzir séries baseadas nos quadrinhos da Marvel, com a elaboração de “Demolidor”, por exemplo. Isso foi possível devido a um acordo entre ambas em 2013, permitindo a inserção do UCM em meios de comunicação que não fossem o cinema. A partir disso, essa parceria acabou trazendo ótimos resultados na época, visto que as séries elaboradas pela Netflix fizeram um grande sucesso com o público e algumas delas foram, até mesmo, renovadas para mais temporadas.


Contudo, em 2019, a Disney lançou o seu próprio serviço de streaming, o Disney+, e, logo, a Netflix se viu obrigada a cancelar todas as séries baseadas nos quadrinhos da Marvel. Sendo assim, além de ter ajudado a introduzir cada vez mais o UCM na realidade dos streamings, o Disney+ foi fundamental para a empresa durante a pandemia da COVID-19, dada a perda de frequentadores no cinema e o deslocamento do público para os aplicativos de assinatura. Desse modo, o serviço da Disney foi capaz de realizar alguns lançamentos de filmes da Marvel, em paralelo com o sucesso das séries que ficaram disponíveis no período de distanciamento social. Um exemplo disso, é “Loki”, que foi assistida por 731 milhões de minutos e já está renovada para uma segunda temporada.


O que esperar da Marvel para os próximos anos?


Depois do grande sucesso dos filmes da Marvel nos últimos 15 anos, o Universo Cinematográfico da empresa continua se expandindo com filmes, séries, curtas e especiais. Entretanto, apesar dos planos ambiciosos de Kevin Feige, produtor cinematográfico norte-americano e presidente da Marvel Studios, o público e a crítica estão, de forma geral, saturados pelo excesso de produções da companhia. Alguns recentes projetos da firma comprovam esse fato, já que “Thor: Amor e Trovão” e “Eternos”, os quais foram lançados nos últimos dois anos, não supriram as expectativas, recebendo inúmeras críticas negativas dos fãs e colunistas. Então, algumas mudanças foram implementadas para se ater à qualidade dos projetos e também não desgastar a marca, que já está comandando esta saga de histórias desde 2008.


O primeiro passo será diminuir o número de produções, uma vez que, nos dois últimos anos, a Marvel já lançou 18 atrações, incluindo 7 filmes, 9 séries e 2 especiais. Por outro lado, entre 2016 e 2019 - os anos de maior sucesso do UCM - a empresa produziu 11 projetos, o que demonstra um certo exagero no recorte mais recente da companhia.


Portanto, é preciso se atentar sobre como a Marvel irá reverter essa situação complexa do cenário atual, uma vez que a grande quantidade de lançamentos pode levar os filmes de super-heróis a deixarem de ser uma grande atração, passando a ser algo mais rotineiro. Por esse motivo, muitas pessoas seguem com uma grande dúvida: será que o UCM será capaz de retornar ao sucesso estrondoso de alguns anos atrás?


Glossário:


1- Era de Ouro dos Quadrinhos: a era de ouro começou em 1938, quando a Action Comics apresentou o seu primeiro super-herói, o Super-Homem. Entre 1938 e 1945, os super-heróis floresceram. Spirit, Capitão Marvel, Flash, Capitão América, Tocha Humana, Sandman e muitos outros nasceram em várias publicações de diferentes editoras.


2- Ianque: relativo ao norte dos Estados Unidos da América.


3- Merchandising: conjunto de atividades e técnicas mercadológicas que dizem respeito à colocação de um produto no mercado em condições competitivas, adequadas e atraentes para o consumidor.


4- Holding: uma empresa que mantém participação acionária em uma ou mais empresas.


5- Streaming: tecnologia de transmissão de dados pela internet, principalmente por áudio e vídeo, sem a necessidade de baixar o conteúdo. Existem diversas plataformas no mercado, como a Netflix, o Prime Video, a HBO Max e o Disney+.


Referências:


BARBOSA, J. Após sucesso nos cinemas, super-heróis tomam conta dos streamings. Disponível em: <https://www.metropoles.com/entretenimento/televisao/apos-sucesso-nos-cinemas-super-herois-tomam-conta-dos-streamings>. Acesso em: 18 abr. 2023.


BICUDO, L. A história do universo Marvel e como o MCU muda as páginas da cultura pop. Disponível em: <https://forasdeserie.com/a-historia-do-universo-marvel-e-como-impacta-a-cultura-pop/>. Acesso em: 18 abr. 2023.


CAMACHO, K. Marvel Comics. Disponível em: <https://pop.proddigital.com.br/empresas/marvel-comics>. Acesso em: 18 abr. 2023.


CARLOS, D. S. Após pressão, calendário da Marvel sofre alterações radicais; o que isso significa para o futuro do MCU? Disponível em: <https://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-1000013473/>. Acesso em: 18 abr. 2023.


CODESPOTI, S. A surpresa do ano: Disney faz acordo para comprar a Marvel Entertainment. Disponível em: <https://universohq.com/noticias/a-surpresa-do-ano-disney-faz-acordo-para-comprar-a-marvel-entertainment/>. Acesso em: 18 abr. 2023.


DOELER, T. Marvel: uma jornada da falência aos bilhões. Disponível em: <https://www.ligai9.com.br/post/marvel-uma-jornada-da-fal%C3%AAncia-aos-bilh%C3%B5es>. Acesso em: 18 abr. 2023.


Marvel: um case de sucesso. Disponível em: <https://ncdfaesa.wordpress.com/2016/10/27/marvel-um-case-de-sucesso/>. Acesso em: 18 abr. 2023.


RAMONE., M. As vendas dos quadrinhos Marvel e DC através dos anos. Disponível em: <https://universohq.com/noticias/as-vendas-dos-quadrinhos-marvel-e-dc-atraves-dos-anos/>. Acesso em: 18 abr. 2023.


STILLMAN, J. The Comic Book Crash of the ’90s And Why Comics Are Safe Today. Disponível em: <https://comicbooked.com/comic-book/>. Acesso em: 20 abr. 2023.



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